sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

SEBO



Hamlet apoiado em Machado
Amarelado Quixote
Debruçado na nau de Camões.
Rasgado Tolstói guerreando
Na orelha dalgum filósofo alemão.
No fim
Amor, guerra, loucura, razão,
Poder, fome, deus e a morte

Retornam ao pó.

ALMA PENADA

raposa vespertina
com o poente esfriando na retina
fareja por comida

raposa rapina,
dando o bote que o instinto ensina,
filho ou filha

raposa repentina
dá mais uma baixa, na surdina.
Na boca, uma cria

raposa canina
corre como se engatasse uma turbina
ao ouvir insana matilha.

raposa menina
distraída se assusta com a buzina
no meio da pista

raposa lupina
ao encher-se de lua desatina
uivando sozinha

raposa clandestina
tem na clandestinidade sua sina,
caça sangue, não vinha

raposa solferina
baila no breu babando. Salina
de suor, masca e saliva

raposa cretina
traz além da boca assassina
o silêncio da fome sombria

raposa calada
é a morte roendo a ossada
atrás da vida acossada

raposa ferida
pelo chumbo da arma homicida
não chora, só manca e esfria.


                                     poema de junho de 2013 

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

O IMPERADOR SOBRE O EMPINADO CORCEL


De que vale a espada desembainhada
Apontada pros céus em ameaça
Se, entre os anônimos da praça,
És presa fácil pra pichação e cagada?

Pra quê tanta glória e história
Chumbadas no bronze, inclusas no nome
Se, hoje, figurando entre o vício e a fome,
És amigo e penico da escória?

De que adianta domar o selvagem corcel
Cujo relincho está trancafiado
Se, imponente e negligenciado,
És nada mais que uma memória ao léu?

Anônimo aos muitos anônimos,
O imperador posa para turistas engraxates
Migrantes mendigos ilusionistas e biscates 
Cheio de si e ’ternizados ânimos.

BRADO DO BARDO BARBADO II


Não busque em mim versos beligerantes,

tampouco amores bebendo refrigerante.
Não rego o poema com enchentes
nem deito nele deixando-o dormente.
Pode o poema estar no sono do ventre;
quiçá entre vermes devorando leão doente,
quiçá entre gaivotas, quiçá escravo...
Não busque função no que esculpo... Desculpe, escrevo.
Da pedra se extrai busto e lápide,
do homem se extrai pedra e cinzel.
Com um formão, abro meu peito!
Com sol e chuva, Tempo talha meu mármore
e " O Imperador Sobre O Empinado Corcel'  
não é uma estátua, é um poema a ser feito


BRADO DO BARDO BARBADO

Ou faço versos cortantes
como cerol
ou corto os pulsos,
dando a palavra ao sangue.

Ou faço versos brilhantes
como bisturi
ou abro o peito
deixando que diagnostiquem e concluam:
só conversa fiada.

Ou faço versos com cerol
escrevendo com bisturi
ou choro o bastante
para que sintam o corte em mim.

Fico com os versos afiados
mesmo estando em cacos
por ser homem barbado.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

CIRCENSE II

Ruflam os tambores:
Mãos encobrem olhos...
Tapam bocas...

Cai o equilibrista da corda bamba
Silenciando a roda de samba.
O malabarista derruba ovos no chão,
O trapezista parece com o cu na mão
E o engolidor de espada
Não parece afiado hoje.

O pirofagista engasga,
A fera masca a cabeça do domador;
O artista erra o alvo e alveja sua irmã
E na plateia não há voluntários
Pra assistente do mágico
No truque do serrote.  

O apresentador anuncia o palhaço
“mas este foi comprar cigarros e se extraviou”,
Informa a desolada mulher barbada.
Da arquibancada calafrios, vaias,
Pipocas, flashes e piadas 
Do episódio do extravio.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

DECORAÇÃO


Viralatasamammendigos
namesmacondiçãotodossãoirmãos.
osmolequesdaperiferiaadoramfazerinimigos
comsuasbombasmobiletesebolasdecapotão.
osvelhoslobosadoramadolescentes
emshortsdeginásticacoladosdesuor.
gatosdomesticadosnecessitamvagabundear
evoltardemadrugadanumcuidadoderato.
ohomemfrustadoprecisareclamar.
culparamulherosfilhosojuízeocoração.
asenhoracomdiabetesamapanetones,
plantassombraCristoeofilhomorto.
obardaesquinaestocanaprateleira
rótuloscommãemulherfilhoseviralatas.

Avizinhanaminharuaantiga
faleceuessesdias
esuacasavazia
ficouvazia
eficounaruavazia
quejánãoéaruaantiga,
nemémaisruaminha,
masláaindahá
umlotadobardesquina.

PROTOCOLAR

ANO NOVO NA PRAIA

MICOSE NA AREIA
MIJO NO MAR
NAS ONDAS SUJEIRA
PÓLVORA NO AR
DESPACHO NA PRAIA
ROSAS À IEMANJÁ
MOLECADA FEIA
ARRASTANDO LÁ.
ESPUMANTE NA AREIA
VELHO A RESSACAR.